Imperialismo (1914)
Foto: Rosa Luxemburgo/ Editora Dietz – Fundação Rosa Rosa
Discurso proferido em Berlim e publicado no jornal Vorwärts (órgão central do SPD). Rosa critica o reformismo no SPD que, dois anos antes, defendia a Tríplice Aliança para garantir a paz. Alianças diplomáticas, numa época em que o imperialismo se tornou “a religião da sociedade burguesa”, são ilusórias defensoras da paz.
Alocução no dia 19 de maio de 1914, durante reunião do grêmio eleitoral social-democrata de Charlottenburg
Com base num relato jornalístico
Referindo-se ao congresso internacional a se realizar em Viena, em que o tema estará no centro dos debates, a oradora caracterizou de maneira acurada as tendências imperialistas do capitalismo e as catástrofes mundiais delas decorrentes.
A camarada Luxemburgo concluiu com a seguinte questão: quais são os meios e caminhos que temos para mudar o nosso modo de lutar? Em um primeiro momento, precisamos empreender algumas correções nas práticas até agora empregadas. Se, há dois anos, um de nossos representantes no Reichstag explicava que nós, social-democratas alemães, apoiamos a Tríplice Aliança e a enxergamos como garantia da paz, tal posição conflita com as consequências do desenvolvimento. Não passa de utopia e ilusão perigosa imaginar que quaisquer alianças diplomáticas possam garantir a paz.
Todas as alianças só têm por finalidade eliminar um inimigo. Se quisermos ter clareza devemos enfatizar que nenhuma aliança dos estados capitalistas é capaz ou pode ter a finalidade de garantir a paz. A única aliança que poderia salvaguardar a paz mundial é a confraternização universal do proletariado internacional. Desse ponto de vista, a comemoração digna da Festa de Maio [Dia do Trabalho] é muito mais importante do que todas as alianças diplomáticas juntas. Temos que nos libertar ainda de outro mal-entendido: a ilusão de que um desarmamento seria possível hoje. Nunca houve um sonho tão breve quanto a esperança de desarmamento. Deveríamos manter uma ironia implacável e cortante em relação a essas frases feitas. Menos ainda do que no desarmamento podemos crer que, cobrindo os meios para o armamento, a fúria armamentista da classe dominante possa ser limitada. A Inglaterra, afinal, é quem melhor prova o oposto. Hoje, o imperialismo não é apenas um tipo de política externa, mas a religião da sociedade burguesa. Um delírio imperialista acometeu toda a sociedade burguesa. Por isso, desapareceu qualquer vestígio de oposição contra o governo, os junker e os provocadores. Esse delírio é um dos motivos do fracasso do parlamentarismo. Os principais procedimentos da política externa são feitos sem o Reichstag. Consta que foi quase uma ironia quando, em maio de 1913, deputados burgueses também participaram da conferência de entendimento franco-germânica em Berna.[1] Mal regressaram, esses senhores lutaram e votaram pelo projeto de lei militar. De que meios devemos lançar mão agora na luta contra o imperialismo? O camarada inglês Keir Hardie e alguns outros propuseram encenar uma greve de massa no caso de uma guerra europeia. O Congresso internacional não deverá se comprometer com isso, mas poderá ser decidido que tenhamos que agir nessa direção. Antes de tudo, no entanto, é necessário aumentar a capacidade de ação das massas. Isso requer em primeiro lugar a disseminação de total clareza sobre a situação e as consequências do desenvolvimento. As massas devem ser conscientizadas de que elas é que devem determinar seu próprio destino. Não podemos confiar em nenhuma ajuda por parte da burguesia. Em segundo lugar, também é necessária uma certa correção nas condições da organização. Deve-se iniciar uma democratização mais forte de toda a vida partidária, bem como da vida sindical. Terceiro, devemos exercer mais autocrítica, em vez de descansar eternamente satisfeitos, como faz o nosso órgão central. A tarefa suprema, mesmo na luta contra o imperialismo, é o aumento da capacidade de ação das massas.
Vorwärts (Berlim), nº 137, 21 de maio de 1914
Tradução: Kristina Michahelles
* Publicado em Gesammelte Werke 3, Berlim Dietz, 1984, p.450-51.
[1] No dia 11 de maio de 1913 foi realizada em Berna uma conferência de entendimento entre 156 parlamentares alemães e franceses, na qual a social-democracia alemã esteve representada por 24 deputados. Por unanimidade, aprovou-se uma resolução condenando o chauvinismo e declarando que a grande maioria do povo alemão e do francês quer a paz e reivindica a resolução dos conflitos internacionais por meio de tribunais.